Acesso rápido:
- A dívida…
- Contragolpe global
- Febre japonesa contagia o país
- Furo de reportagem
- Procura-se um sócio
- José Wilker e Rubens Furtado saem
- Nilton Travesso e Jayme Monjardim chegam
- Estreia “Olho por Olho”
- A demissão de Clodovil
- Em Belém
A dívida…
A emissora entrou pelo ano de 1988 com uma dívida que beirava US$ 34 milhões, boa parte composta pelo arrolamento do empréstimo feito para a estruturação das cinco emissoras, cerca de seis anos antes. Mas, se por um lado, a Manchete tinha custos altos de produção, por outro se consolidava em audiência e reconhecimento da crítica ano após ano, um paradoxo que nunca deixaria de fazer parte da história da “TV do ano 2000”.
Mesmo com a situação financeira delicada, Adolpho Bloch reinvestiu em novos projetos e, já em agosto, a linha de shows foi reativada. Foram ao todo 19 programas novos, entre eles o humorístico “Cadeira do Barbeiro” com Lucinha Lins e Cacá Rosset, e a novela policialesca Olho por Olho. Ainda neste mesmo ano, em julho, a Manchete cobriu as Olimpíadas de Seul.
Contragolpe global
Pela primeira vez a Manchete ficou fora das transmissões dos desfiles cariocas. Já sem Brizola governando o Rio desde o ano anterior (seu último ano de governo foi em 1986), a Globo conseguiu adquirir, ao longo de 1987, a totalidade dos direitos do carnaval de 1988, e pôde finalmente dar o troco: transmitir os desfiles com exclusividade, da mesma forma que a emissora dos Blochs havia feito em 1984.
Mesmo apelando à justiça, alegando que o evento foi não foi negociado honestamente, a Manchete deixou de realizar a cobertura da qual fazia questão de se fazer uma referência. O jeito foi cobrir as festas de rua e bailes com maior intensidade por todo o país. A cobertura alternativa teve como saldo dois aspectos com ‘benefícios’ bem distintos:
- Deu destaque ao carnaval de outras regiões do país, com maior tempo para exibição dos trechos dessas festas em rede nacional.
- Travou uma disputa indecente com a Bandeirantes pela audiência dos ‘famosos’ bailes da madrugada, famosos pelos “closes” indiscretos. O governo ficou extremamente incomodado, considerando o episódio como verdadeira pornografia na TV aberta. Deputados queriam pedir punições sérias, alguns mais exaltados falavam até em cassação. As emissoras se retrataram.
O mal estar causado com o governo devido à ousadia dos bailes de carnaval, no entanto, provocou a saída de Alexandre Garcia, então diretor de jornalismo da Manchete em Brasília e colunista do Programa de Domingo, direto para a Globo. O jornalista alegou que, quando fez lobby para que os canais fossem dados à Manchete, “garantiu aos militares que a Bloch não mostraria semi-nudez feminina como fazia de costume em suas revistas“.
Chamada do Carnaval 1988
A chamada da Manchete tinha sérias críticas à exclusividade da Globo, ironicamente.
Febre japonesa contagia o país
Em fevereiro, estreou o seriado japonês Jaspion, do gênero tokusatsu, que vinha sendo produzido aos lotes em seu país de origem. Repleto de cenas de ação protagonizadas por super-heróis armados contra monstros alienígenas, o formato perduraria pelos anos posteriores através de uma série de outras atrações semelhantes. Jaspion fez um enorme sucesso, incentivando a emissora a lançar ainda no mesmo ano Changeman, que alcançou ainda maiores índices de audiência e virou mania entre as crianças .
Os programas eram exibidos pela manhã e reprisados no final da tarde, dentro do Clube da Criança. Alavancou a audiência e aumentou a visibilidade da promissora Angélica, que logo se consolidaria como a maior estrela da Manchete.
Furo de reportagem
Luiz Carlos Azenha, correspondente da emissora em Nova York, foi designado para a cobertura, em Moscou, do primeiro encontro em 40 anos dos líderes dos Estados Unidos e União Soviética. As superpotências mundiais, rivais desde o fim da Segunda Guerra, atraíram os olhos do mundo, mobilizando mais de 5 mil jornalistas, de mais de sessenta países, para cobrirem o encontro a na capital soviética.
Azenha aproveitou um raro momento em que o líder soviético descia do carro para entrar no Kremlin, sede do governo. O repórter furou o isolamento e, com microfone em punho, falou: “Sr. Gorbachev, somos da TV do Brasil, eu gostaria de lhe fazer uma pergunta! Quando o senhor irá ao Brasil?”
Surpreso, Gorbachev pediu que um assessor traduzisse, e respondeu: “Como eu gostaria de visitar o Brasil…, a América Latina!… E um grande desejo meu, espero algum dia poder aproveitar os convites oficiais que eu tenho recebido. Estou contando com uma visita à América Latina. Confesso que estou acompanhando com interesse os acontecimentos na América Latina. É um continente que entrou num processo dinâmico, está numa etapa bem complicada do seu momento histórico, mas creio que os povos daquela região vão superar estas dificuldades e têm à sua frente um caminho amplo e independente.”
O trecho foi exibido pelas TVs de todo o mundo, pois era a primeira vez que se via um líder soviético dando entrevista de maneira espontânea, e na rua. Até o Jornal Nacional exibiu, com os devidos créditos. E rendeu ainda uma mensagem de Boni, parabenizando Adolpho Bloch.
Dias depois, Azenha repetiria o feito, mas dessa vez fazendo duas perguntas à primeira-dama soviética. Usou a mesma estratégia para saber se 1) havia rivalidade entre as primeiras-damas das duas potências e 2) se ela acreditava em astrologia. Sorrindo, respondeu de forma negativa, e com bom humor, às duas perguntas.
Procura-se um sócio
Em junho, a Manchete já poderia ser vendida, total ou parcialmente, de acordo com a Lei das comunicações. Adolpho Bloch sondou possíveis sócios para a TV já no ano anterior, propondo a cessão de 40% da empresa, mantendo assim o controle acionário com a família.
Os grupos Odebrecht, Paranapanema, a mexicana Televisa, a norte-americana Viacom, e até Orestes Quercia negociaram ao longo de quase 1 ano, mas no fim, nada se concretizou.
José Wilker e Rubens Furtado saem
Ainda em junho, Wilson Cunha estreava o Cinemania, direcionado aos amantes da sétima arte. O programa ia ao ar aos sábados, e trazia prestígio.
Na dramaturgia a novela Carmem chegava ao final, mas a produção de sua substituta estava atrasada. Oficialmente José Wilker declarou que a direção do canal resolveu paralisar a produção de novelas para turbinar o Complexo de Água Grande. Segundo o diretor, a produção de duas novelas estava sendo extremamente difícil, obrigando as obras a terem mais cenas externas, e portanto, maiores custos.
Informalmente a imprensa dizia que Carmem tinha sido muito cara para o pouco retorno que deu. A novela acabou tendo audiência satisfatória na sua reta final, mas diante do alto investimento que teve, tinha dado prejuízo. O começo capenga da novela, somado à alta dos juros das dívidas da empresa, teria deflagrado o fim de programas nos últimos meses de 1987.
Carmem foi substituída pela reprise de Dona Beija, seu maior sucesso até então. A campanha de relançamento da novela teria irritado a atriz Maitê Proença pelo forte apelo sensual. A atriz deixou a Manchete depois de praticamente 3 anos trabalhando no canal.
José Wilker voltou para a Globo. Disse à imprensa que faltava dinheiro à televisão porque “na Manchete, a TV financiava a editora“, um “privilégio” que não se justificava diante da tendência do mercado (encolhimento da mídia impressa versus crescimento do audiovisual).
Nota do autor:
No fundo, nos anos seguintes, diferentes analistas repetiriam esta tese como uma causa para a fragilidade do caixa da emissora. Ou seja, para manter as revistas num patamar de custos que não mais se pagavam com as receitas das próprias revistas, o grupo se enrolava sem fazer uma alocação de custos clara, que pudesse deixar expostas as perdas com divulgações cross-media e pagamento de salários e de custos estruturais compartilhados entre empresas.
Tipicamente um (mau) comportamento peculiar de grandes conglomerados familiares da época. A Manchete operava em regime de caixa único, ou seja, sequer a contabilidade era separada por empresas…
Além de Wilker e Proença, Rubens Furtado (desde 1983 no cargo de diretor-geral) troca a Manchete pela Bandeirantes.
Nilton Travesso e Jayme Monjardim chegam
Nilton Travesso, que até então produzia o Mulher 87 via sua produtora Equipe A, foi contratado para ser diretor de Programação da Manchete. Além de capitanear a nova sede paulistana, o diretor fez uma proposta para que Jayme Monjardim assumisse a Direção Artística (e de dramaturgia), função antes exercida por José Wilker.
Monjardim havia deixado a Globo logo após dirigir a novela Sinhá Moça (1986/87) porque queria imprimir uma linguagem mais cinematográfica, e não via espaço na líder. Mas o jovem e promissor diretor viu, na proposta da Manchete, a possibilidade de experimentar parte das inovações que tinha em mente. E aceitou o desafio.
Expedito Grossi passou a ser o diretor-geral da emissora, na vaga de Rubens Furtado. Monjardim, Travesso e Grossi seriam grandes responsáveis pela fase de sucessos que a Manchete atravessaria.
Estreia “Olho por Olho”
Em 22 de agosto, substituindo a reprise de Dona Beija, enfim estreou a novela Olho por Olho. Escrita por José Louzeiro, era uma história policial e tinha o claro objetivo de repetir o sucesso de Corpo Santo, do mesmo autor.
A novela foi idealizada ainda durante a gestão de José Wilker, mas com o atraso da novela, acabou sendo gravada depois de sua saída. Foi dirigida por Atílio Riccó e Marcos Schetmann, e contava com Georgia Gomide, Débora Duarte, Flavio Galvão, Henrique Martins e Herson Capri no elenco. Não chegou a atingir índices animadores de audiência, mas cumpriu seu papel.
A demissão de Clodovil
No seu programa diário Clô Para os Íntimos, o apresentador se envolveu em uma polêmica ao expor sua opinião sobre a Constituição de 1988, que estava em votação no Congresso Nacional. Depois de chamar a Assembléia de “prostituinte”, Adolpho Bloch demitiu o apresentador.
Clodovil alegou que Bloch recebeu uma ligação do presidente da Assembleia Constituinte, Ulysses Guimarães, pedindo a cabeça do apresentador.
Em Belém
A Manchete chegou a Belém do Pará através do canal 11, TV Carajás. A afiliação foi assinada em junho de 1988.