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Fenômeno Pantanal estampou capa da Veja em 1990

Pouco mais de um mês depois de estrear, Pantanal já era um sucesso inesperado de audiência, deixando a Manchete eufórica, as concorrentes assustadas, e o mercado convencido que a emissora poderia concorrer pela liderança global, a ponto de ser capa da Veja em maio de 1990.

Revista Veja – 9 de maio de 1990

Tiroteio no Vídeo

A Globo reage à disparada de popularidade da novela Pantanal, estuda alternativa para o horário nobre e declara aberta a guerra pela audiência

Algo de extraordinário está acontecendo na televisão brasileira, e não se trata da estréia de uma nova emissora ou da entrada no ar de um programa revolucionário. A programação das redes continua se apoiando no tripé básico de novelas, telejornalismo e filmes – salpicada pelos programas humorísticos, de auditório, seriados, shows e desenhos animados.

A grande mudança está acontecendo na frente dos aparelhos de televisão. Na medida em que o tempo passa, fica cada vez mais claro que a novela Pantanal, apresentada pela Rede Manchete às 9 e meia da noite de segunda-feira a sábado, caiu definitivamente nas graças do público. Nos últimos índices de audiência disponíveis do Ibope, nos horários de melhor desempenho Pantanal bate sistematicamente os programas da Rede Globo.

Na quarta e quinta-feira da semana passada, em São Paulo, Pantanal ficou em primeiro lugar, o SBT em segundo e a Globo em terceiro. O triunfo de Pantanal não se mede apenas pelos seus percentuais de audiência. Para além dos números, a novela da Manchete é hoje o programa mais comentado do Brasil, e Cristiana Oliveira, a deslumbrante estrela de Pantanal, transformou-se numa figura nacional praticamente da noite para o dia.

Já houve anteriormente casos de a Globo ser batida no seu horário pós-novela. Foi o que aconteceu com a minissérie americana Pássaros Feridos, apresentada pelo SBT, e com Dona Beija, da própria Manchete. Com Pantanal, a situação é diferente, num aspecto crucial: a reação Globo. Na direção da emissora, os índices e o falatório a respeito de Pantanal provocaram um frenesi de reuniões, de improvisações e estudos de alternativas para combater a bela e brava onça da Manchete.

A Globo sentiu-se vulnerável e, a toque de caixa, pôs no ar anúncios das minisséries A, E, I, O, Urca e Desejo, que não estavam sequer prontas, condensou e apresentou de supetão Todas as Mulheres do Mundo na sexta-feira passada e meio que colocou sob suspeita alguns dos seus programas do horário das 9 e meia da noite, a começar por TV Pirata.

Cristiana Oliveira, a Juma de Pantanall, 1990
Cristiana Oliveira, a Juma de Pantanal, 1990

Bichos X Gângsteres

Além dos pontos no lbope, um episódio de dimensão simbólica pesou na decisão da emissora líder de reagir rapidamente a Pantanal. Na quinta-feira dia 26, a Globo comemorou seu 25º aniversário e programou para o mesmo horário da novela da Manchete uma das suas grandes atrações para o ano – o filme Os Intocáveis, pelo qual pagou 200 000 dólares.

Involuntariamente, o filme continha uma alusão ao poderio intocável da Globo no que diz respeito a galvanizar a audiência. O filme foi ao ar, mas, nos instantes de pico, o público preferiu os bichos, plantas e beldades desnudas de Pantanal aos gângsteres, policiais e tiroteios de Chicago.

É uma operação difícil interromper bruscamente a carreira de sucesso de uma novela em ascensão, mesmo para uma emissora de público monumental como a Globo. É quase tão complicado quanto fazer fora da Globo uma novela com condições de competir para valer com a programação global.

A experiência e o talento da Globo em produzir novelas a tornaram praticamente imbatível no gênero, já que há longos anos o grosso do público habituou-se ao padrão da emissora. No caso do sucesso de Pantanal, porém, é possível relacionar alguns motivos para explicar como ela deslizou tão bem num terreno tão acidentado.

  • Em lugar das locações habituais das novelas da Globo, encenadas nas ruas do Rio de Janeiro, de São Paulo ou em cidades cenográficas que simulam lugarejos interioranos; como a Santana do Agreste de Tieta, a novela da Manchete mostra os cenários deslumbrantes do Pantanal Mato-Grossense. Tem-se aí uma novidade visual arrebatadora para o telespectador: em vez das ruas e ambientes por onde ele circula todo dia, um panorama que ele não conhece. Em lugar de carros e uma praça cheia de figurantes, atores que circulam entre jacarés, sucuris, onças-pintadas, capivaras; e tuiuiús. Pouca gente sabia que o Pantanal era tão bonito.
  • Uma novela pode ser boa ou ruim, mas sabe-se que ela emplacou junto ao público quando seus personagens começam a ser comentados nas ruas e nas rodas de conversa. Como ocorreu com a viúva Porcina de Roque Santeiro, o Tabaco de Roda de Fogo, a Odete Reutemann de Vale Tudo e a Perpétua de Tieta. A trama de Pantanal nada tem de especial – é o velho folhetim que se repete -, mas a novela ostenta dois personagens que caíram na boca do povo, a selvagem e estonteante Juma de Cristiana de Oliveira e o José Leôncio de Paulo Gorgulho – que, de tanto sucesso na primeira fase, vai voltar na pele de outro personagem. Rainha da Sucata tem uma constelação de astros jamais reunida num elenco, mas até agora nenhum dos personagens que eles interpretam mexe com o espectador. Sucata, apesar de líder absoluta no horário, não é comentada, não pegou.
  • Pantanal apresenta atores novos que, além de se saírem bem em seus papéis, oferecem a sensação de frescor, de novidade. Nesse terreno, a Globo tem conseguido apenas renovar seu estoque de rostos bonitinhos e sem sal, em papéis irrelevantes. Ninguém jamais espera ver pintar nas novelas da Globo uma cara pouco conhecida no time dos personagens principais – tanto que a idade desses está muito distante da juventude. Entre o olhar enigmático de Cristiana Oliveira e os trejeitos de Regina Duarte, a novidade fica com a primeira.
  • Há, por fim, as decantadas cenas de nudez e erotismo de Pantanal, expediente a que a Manchete recorre com freqüência, mas que nem sempre dá resultado. O recurso funcionou com Maitê Proença em Dona Beija e, agora, repete a dose com Cristiana Oliveira e suas amigas. Nudez e erotismo ajudam a que o público masculino, mais resistente a novelas, se interesse por Pantanal. “O telespectador assiste à novela, vai dormir em seguida e sonha com a Juma nua”, explica um diretor de novelas da Globo. “No dia seguinte, é claro, ele está novamente sintonizado na Manchete”.

“Exploração do sexo”

Enquanto na Manchete a euforia é total, engolfando desde porteiros até Adolpho Bloch, o dono da emissora, nas emissoras concorrentes se reconhecem as virtudes de Pantanal. “A Manchete realmente acertou com o seu Pantanal de paisagem magnífica”, aplaude Silvio Santos, dono do SBT.

José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, sintetiza da seguinte maneira sua opinião sobre a novela da Manchete: “Ela trouxe uma paisagem nova e atraente para a televisão. Há também uma maior ousadia no tratamento dado às cenas de sexo, sem ultrapassar os limites do bom gosto. Embora lenta e arrastada inegavelmente a narrativa tem apelo. Como profissional, considero saudável uma concorrência que busca a qualidade, especialmente quando jovens de talento, como Jayme Monjardim Matarazzo, estão envolvidos no processo.”

“A Manchete realmente acertou com o seu Pantanal de paisagem magnífica”,

Silvio Santos, um mês após a estreia de Pantanal

Para Roberto Marinho, presidente das Organizações Globo, há que se tomar alguns cuidados ao se avaliar Pantanal. “A novela não é essa estrela que a Manchete diz ter acendido”, diz ele. “Ela não é um sucesso absoluto coisa nenhuma, pois para conseguir sucesso real seria preciso colocar no ar uma novela no mesmo horário das da Globo, e vencê-las.” Essa concorrência direta deve acontecer num futuro próximo. “Estamos nos preparando agora para fazer novelas para o horário nobre”, avisa Adolpho Bloch. “Vamos apresentar uma novela às 7 horas, telejornais e uma outra novela às 8 e meia, como a Globo”, diz Silvio Santos.

Roberto Marinho considera ainda que Pantanal faz “exploração do sexo’. Ele não entende por que, apesar dessas restrições, a Globo não adquiriu os direitos de Pantanal quando eles lhe foram oferecidos A Globo poderia até apresentar a novela, mas sem as apelações sexuais”, afirma.

Subversão

Roberto Marinho faz com tranqüilidade essas ponderações a respeito da possibilidade de a Globo ter feito Pantanal, mas nos escalões intermediários da Globo o caminho da autocrítica é percorrido com amargor. Mesmo assim, há razões compreensíveis para a emissora ter rejeitado o projeto de Pantanal. Quando se tem 80% de audiência com novelas, gravadas no próprio Rio de Janeiro, é difícil aceitar a idéia de gastar mais tempo, mais dinheiro, viajar até o Pantanal e arriscar-se a produzir uma novela sem garantias de agradar ao público.

Mas é só quando as regras são rompidas que ocorrem surpresas, e não só no caso de Pantanal. Nos Estados Unidos, por exemplo, a atual febre televisiva é o seriado Twin Peaks, dirigido pelo cineasta David Lynch, responsável no cinema por filmes artísticos e inovadores como O Homem Elefante e Blue Velvet. Lynch subverteu as regras dos seriados e o seu Twin Peaks vem obtendo uma extraordinária repercussão.

A diferença é que o seriado revolucionário de Lynch foi bancado pela rede ABC, enquanto a Globo refugou ante uma novela muito mais adaptada às normas da televisão brasileira, como é o caso de Pantanal. O autor de Pantanal, Benedito Ruy Barbosa, ofereceu repetidamente a novela a diversos escalões da diretoria da Globo, que sempre a recusaram como se fosse um projeto mirabolante de um autor excêntrico. Agora, os responsáveis pela recusa de Pantanal, ao lado dos caça-talentos da emissora, encarregados da renovação do quadro de atores, estão justamente entre os funcionários a quem a Globo atribui um quinhão alentado de responsabilidade pela derrota diante da Manchete no horário das 9 e meia.

Segundo Benedito Ruy Barbosa, depois de muita insistência, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho autorizou um estudo de viabilidade da novela. Dois diretores da emissora, Herval Rossano e Atílio, Riccó, voaram para o Pantanal, mas era época da cheia e eles voltaram no mesmo dia atestando a inviabilidade de gravar uma novela na região.

“O voto contrário mais forte foi de Daniel Filho”, informa o novelista. “Não me eximo da responsabilidade pela perda de Pantanal para a Manchete, mas acho que a novela ainda hoje seria inviável na Globo”, diz Herval Rossano. “A Globo é uma empresa grande demais, em que os atores trabalham no máximo oito horas por dia e fazem exigências que não fazem nas outras emissoras”, ele completa.

Cristo e solidão

Com relação a Pantanal, o grande pavor é o que virá depois. “Não podemos nos dar ao luxo de errar”, diz Jayme Monjardim, diretor da novela da Manchete, que desde Roque Santeiro, na Globo, vem se revelando um dos profissionais mais capacitados em sua especialidade. Embora Pantanal deva permanecer no ar ainda por sete meses, a Manchete já investe verbas e idéias na novela que irá sucedê-la.

Há alguns projetos em andamento. Um deles é contar a vida de Jesus Cristo e seus apóstolos, na versão fantasiosa e instigante do escritor espanhol J.J. Benítez no best-seller Operação Cavalo de Tróia. O outro projeto é transformar em novela o romance Cem Anos de Solidão, do colombiano Gabriel García Márquez. Um primeiro contato com o escritor foi realizado pela diretora Tizuka Yamasaki, que partirá ao seu encontro juntamente com Monjardim, nas próximas semanas, para acertar os detalhes.

Imagem de Pantanal da Rede Manchete
Jayme Monjardim assiste em sua sala, na sede da Rede Manchete no Rio de Janeiro, as cenas de Pantanal

Monjardim diz que a expectativa da Manchete quanto à sucessora de Pantanal é imensa não apenas porque a emissora quer manter o seu ibope em alta, mas porque sabe que a Globo, além das medidas de emergência para frear o sucesso da concorrente neste momento, prepara chumbo grosso mais à frente. Embora improvisação seja uma palavra frequente no mundo da televisão, em matéria de planejamento as emissoras se preparam detalhadamente para estocar as rivais em seus pontos mais vulneráveis, exatamente como em qualquer indústria de refrigerantes ou sapatos. A Globo se prepara para detonar, no próximo ano, um projeto que pode mudar o rosto da telenovela brasileira.

Sob a direção de Walter Avancini, a emissora parte para novelas internacionais, co-produções com outros países que permitirão que a trama e seus personagens viajem pelo mundo, oferecendo aos telespectadores brasileiros novos cenários e informações.

Faturamento

Adepto da tática de guerrilha, que implica mudanças inesperadas, Silvio Santos colocou de pernas para o ar a programação do SBT na semana passada e chamou a Globo para um duelo às 8 da noite. A partir desta segunda-feira, ele colocará o prestigiado TJ Brasil, apresentado pelo jornalista Boris Casoy, no mesmo horário do Jornal Nacional. É a quinta alteração de horário do principal telejornal do SBT em menos de dois anos. Mais para frente o empresário pretende apresentar uma novela depois do telejornal, exatamente como a Globo.

“Estou sentindo, através de conversas com formadores de opinião, que o nosso TJ Brasil tem mais credibilidade que o Jornal Nacional e, como acredito que o público das classes A e B chega em casa depois das 7 e meia, acho que o certo é passar o nosso telejornal para as 8 horas’, diz o empresário. Boris Casoy topou a parada. “Com um telejornal politicamente livre e agressivo, temos muito a oferecer ao telespectador”, diz o jornalista. ” A Globo tem a seu favor um Jornal Nacional bem feito e o hábito dos telespectadores, mas acho que a passagem de tempo jogará a nosso favor.”

Silvio Santos reconhece que perdeu 1 ou 2 pontos para a Manchete no horário das 9 e meia, mas que isso não é preocupante em termos de faturamento comercial. “Quem deve estar preocupada com faturamento é a Globo”, diz Silvio Santos. “O anunciante paga para que o programa em que seu produto aparece tenha uma determinada audiência e, quando ela fica um ou dois pontos abaixo, ele está na margem de segurança”, explica. “Mas quando uma emissora do porte da Globo perde mais de 10% de sua audiência para Pantanal, aí o anunciante reclama e quer pagar menos, e com razão, pois desembolsou uma determinada cifra para atingir um público de determinado tamanho, que não foi atingido.”

Arca perdida

Já na Globo, apesar da correria dos últimos dias, quando as minisséries A, E, I, O, Urca e Desejo começaram a ser editadas a toque de caixa, decidiu-se ir um pouco mais devagar com o andor, esperar a poeira de Pantanal assentar e só então decidir quando colocá-las no ar. O departamento comercial da emissora quer ver Desejo no ar imediatamente, enquanto os responsáveis pela programação preferem aguardar um pouco. O A, E, I, O, Urca, prevista para durar vinte capítulos, é uma minissérie musical que pretende reproduzir o mundo encantado do Cassino da Urca no Rio de Janeiro dos anos 40, com um elenco em que despontam Débora Bloch, Beatriz Segall e Carlos Alberto Riccelli.

A correria para colocar no ar as minisséries tem causado certa apreensão em alguns atores da Globo. “Temo que uma edição feita às pressas possa comprometer um trabalho duro que fizemos ao longo de vários meses”, diz Vera Fischer, que faz o principal papel feminino em Desejo, minissérie que conta a história do escritor Euclides da Cunha, principalmente a sua morte, assassinado pelo amante da mulher. “Desejo é sem dúvida um trunfo importante, mas seu sucesso é imprevisível, pelo menos nas proporções em que está sendo exigido”, pondera a atriz, cautelosa com o que a espera pela frente.

Para realizar seus ambiciosos projetos na área de dramaturgia, a Globo terá que resolver um problema que passou a incomodá-la com particular insistência depois do sucesso de Pantanal. A emissora não consegue rechear suas novelas com novos valores. Segundo se comenta nos corredores da Globo, os caçadores de talento da emissora não se lançam para valer em busca da arca perdida, preferindo favorecer amigos e parentes no mais puro estilo das empresas estatais.

Os próprios protegidos de astros da casa, como Gabriela Duarte e Marcelo Faria – filhos de Regina Duarte e Reginaldo Faria -, passaram pelo vídeo também em Top Model como quem atravessa uma rua em hora de movimento – incógnitos. Para completar, os cursos para iniciantes que a Globo mantém também não estão rendendo os resultados esperados.

Narizinho arrebitado

Enquanto isso, primeiro em Kananga do Japão e agora em Pantanal, a Manchete joga na praça um punhado de artistas novos que têm o que dizer ao público. O principal deles é a atriz Cristiana Oliveira, a morena monumental de traços finos e olhar penetrante.

O elenco de apoio também exibe novidades, como a gaúcha Luciene Adami, de 26 anos, que interpreta a sensual e insinuante Guta, a moça da cidade grande que choca o Pantanal com seus hábitos avançados e encanta os telespectadores; com seus cabelos curtos e o narizinho tão arrebitado quanto o restante de seus dotes físicos, fartamente exibidos em cenas de nudez explícita.

Luciene só está na Manchete porque foi dispensada pela Globo. Ela fez testes para a novela Ti Ti Ti, de Cassiano Gabus Mendes, e chegou a gravar várias cenas. Uma semana antes de a novela entrar no ar, foi informada de que seria substituída porque seu sotaque sulista era muito forte.

Entre os rostos masculinos, Pantanal serviu para uma outra revelação além de Paulo Gorgulho: o ator Marcos Winter. No papel de Jove, com a dura tarefa de substituir na qualidade de principal atração masculina a arrasadora mistura de machismo e ingenuidade apresentada por Gorgulho como o José Leôncio da primeira fase, o magricela Winter desempenha com desenvoltura o menino mimado da cidade grande que aporta no Pantanal disposto a reencontrar o pai.

Quem ganha

Enquanto assiste às concorrentes alterar suas programações e prepara novas investidas; para preservar o terreno conquistado, a Manchete saboreia o sucesso. “Hoje a novela Pantanal representa 30% de todo o faturamento publicitário da rede”, informa David Elkind, diretor financeiro da emissora. “Em televisão, o que existe é novela, telejornal e o resto”, ele avalia. Com faturamento, em abril, de 8,4 milhões de dólares, a diretoria da Manchete garante que está afastada a hipótese, levantada há mais de um ano, da venda da emissora ou de parte de suas ações.

Embora exulte com o sucesso de sua novela, a Manchete sabe que é impossível abater a liderança da Globo com um tiro só. Se depois de Pantanal ela apresentar uma novela do quilate de Carmem (uma das piores coisas já exibidas na televisão brasileira, quiçá mundial), seu triunfo hoje não terá conseqüências. Nos escalões superiores da Globo, porém, o sucesso atual de Pantanal serviu de alerta para o fato singelo de que o público aceita bons programas em qualquer emissora.

Nos escalões inferiores da Globo, principalmente entre atrizes e atores, a moda é elogiar Pantanal, com a torcida para que a Manchete obtenha cada vez mais sucesso. Com isso, raciocina-se, abre-se um outro mercado de trabalho. Faz sentido, mas na mente de muitos integrantes do elenco global, no entanto, esconde-se uma velha esquizofrenia: a de ter vergonha de falar mal da empresa que lhes paga ótimos salários no final do mês.

Nessa turma estão aqueles que, na campanha eleitoral, apareciam no horário gratuito do PT fazendo gracinhas com a linguagem da Globo para atacar Collor e, minutos depois, estavam na tela da emissora cantando que “a Globo 90 é nota 100”.

Para Silvio Santos, mesmo que o sucesso no momento esteja com Manchete, ele se entusiasma com o abalo na Globo e sem um pingo de maldade ou ressentimento. ” O ideal seria que todas as redes e emissoras apresentassem bons programas, os empresários tivessem bons lucros e os funcionários recebessem ótimos salários”, diz o empresário do SBT.

“É o que acontece nos Estados Unidos, onde as redes CBS, NBC e ABC disputam a audiência palmo a palmo, há TV a cabo e não falta dinheiro para ninguém”. No Brasil, o tiro certo de Pantanal e a preocupação das redes com o sucesso da novela e a competição para cativar a audiência oferecem uma imagem das virtudes da existência de concorrência. E quem sai ganhando com essa concorrência, em primeiro lugar, é o telespectador.

Por Diogo Montano

Diogo Montano é Bacharéu em Ciência da Computação, pós graduado em Gestão de Negócios, e trabalha há quase vinte anos unindo duas coisas que sempre gostou: comunicação e tecnologia. Cresceu assistindo à Globo e Manchete, canais de tv que tinham as melhores imagens da região. Em 1999, ainda antes de entrar na faculdade, publicou a primeira versão deste site, logo após a venda da Manchete.