Pantanal foi o maior sucesso da TV Manchete, um dos maiores do gênero no país, e, principalmente, um divisor de águas na história da TV brasileira. A partir da terceira semana, já ocupava a liderança de audiência, foi capa da Veja, e gerou subprodutos que viraram mania no país, levando euforia à Bloch.
A novela foi ao ar de 27 de março a 10 de dezembro de 1990, às 21h30, com texto de Benedito Ruy Barbosa e direção geral de Jayme Monjardim.
Prazer, “controle remoto”
O maior feito da novela, no entanto, foi ter ensinado o telespectador da Globo a mudar de canal, provocado uma mudança de hábito que influenciaria a partir dali a distribuição de audiência entre as emissoras. Com Pantanal, os brasileiros das classes B e C, principalmente, perceberam que poderia haver atrações de qualidade nas outras emissoras, mais precisamente, naquele momento, na Manchete.
Efeito Cascata
Toda a grade da emissora foi impulsionada com o sucesso da novela, levando à liderança, com freqüência, programas que já costumavam aparecer em segundo lugar. A emissora abriu distância do SBT, se isolando no segundo lugar no Rio. Em São Paulo, aumentou a distância para a Bandeirantes (com a qual disputava a terceira posição), e passou a brigar com o canal de Silvio Santos.
No resto do país, onde não havia audiência em tempo real, as pesquisas mostravam desempenho semelhante ao Rio. Portanto, a emissora ocupou a vice liderança nacional, empurrando o SBT para a terceira posição (em faturamento a Manchete já era vice-líder havia alguns anos).
Já em seu primeiro mês de exibição, com a novela anotando médias de mais de 30 pontos tanto no Rio como em São Paulo (cidades onde havia medição em tempo real de audiência), a Manchete viu crescer também os números do Jornal da Manchete, atração que a antecedia diariamente. E também registrou crescimentos expressivos de audiência nos programas exibidos logo após a novela.
Na faixa das 22h30, de segunda a sexta, composta por programas diferentes a cada dia da semana, comumente conhecida como Linha de Shows, foi a que registrou maior efeito positivo, já que os programas passaram a começar com muito mais telespectadores que antes. Após 3 semanas, só no Rio de Janeiro, teve programa crescendo 1200% no Ibope:
- Às segundas-feiras, o Manchete Documento pulou de 1 ponto- em março – para 9 pontos de média no Rio, em abril.
- Às terças, a faixa dramatúrgica de casos especiais Fronteiras do Desconhecido teve a maior alta: de 1 ponto em março, cresceu até marcar 12 pontos em 8 de abril, uma alta de 1200%.
- Às quartas, o humorístico O Cabaré do Barata subiu de 9 para 13;
- O Ibope do Manchete Especial, atração das quintas, foi de quatro para sete pontos.
- Por fim, o Documento Especial, jornalístico das sextas-feiras, subiu de 11 para 15 pontos.
Os números das quartas-feiras subiram 50%, elevando a audiência do humorístico Cabaré do Barata, de Agildo Ribeiro, de 9 para 13 pontos no Grande Rio.
No mesmo período, o Jornal da Manchete cresceu, no Rio, de 6 para 9 pontos e, em São Paulo, de 3 para 5. Na segunda-feira, dia 7 de abril de 1990, quando a guerra se declarou formalmente, com o atraso da programação da Globo, Pantanal saiu incólume em São Paulo – a perda inicial, nos primeiros sete minutos, com 24 contra 41 da Globo, reverteu-se nos 50 minutos restantes da novela, quando a Manchete ficou com 32 pontos e a Globo com 28.
Nos meses seguintes, a emissora valorizou a faixa noturna, e produziu minisséries, como O Canto das Sereias, que teve médias de 22 pontos.
“Diferente demais”
Benedito Ruy Barbosa era autor de novelas do horário das 18h da Globo, onde havia emplacado alguns sucessos do horário, como Cabocla, Paraíso e Sinhá Moça. Em 1983, após uma viagem à região, começou a fazer a sinopse de uma história ambientada no Pantanal, e o apresentou à direção da emissora duas vezes. Mas o desafio logístico espantou o interesse dos diretores, que consideravam a região afastada e complicada.
Já sua então principal concorrente no gênero, a Manchete, tinha um jovem e promissor talento à frente de sua direção artística, o também ex-global Jayme Monjardim. Em comum com Barbosa, Monjardim também havia deixado a líder por não ter encontrado espaço para pôr em prática suas ideias, consideradas ousadas demais para a TV comercial.
A Manchete vivia uma boa fase. Tinha Nilton Travesso liderando a área de programação, Angélica e seriados japoneses freqüentando o segundo lugar, Leila Cordeiro e Eliakim Araujo atingindo 10 pontos no Jornal da Manchete, e o premiado Documento Especial “mordendo” a liderança. Para completar, exibia Kananga do Japão, uma novela caprichada, sem apelos, aprovada pela crítica e pelo público, e vice-líder no horário.
Prestigiado, Monjardim conversou com Ruy Barbosa e se comprometeu a desenvolver a sinopse de “Amor Pantaneiro”, conseguindo fazer o veterano trocar sua cadeira confortável na Globo para entrar mata adentro vestindo o uniforme da Manchete.
Adolpho Bloch imaginou usar Pantanal para reabrir o segundo horário de novelas, às 19h30, que não tinha tramas inéditas havia dois anos. Mas com “Kananga do Japão” se aproximando do fim e sem outra opção à altura para substitui-la, Monjardim solicitou que Benedito ajustasse a sinopse para que ela deixasse de ter as amarras que o horário para o qual fora planejada exigi, estreando, portanto, na faixa mais nobre da dramaturgia da Manchete.
Abertura e Encerramento de Pantanal
Originais da Manchete, remasterizados, acervo pessoal.
Estreia Pantanal
Os primeiros capítulos impressionaram, com cenas exuberantes, cinematográficas, de uma região desconhecida de boa parte do país. Nas semanas seguintes, a audiência galopou. Com pitadas de erotismo e personagens lendários, ultrapassou a TV Globo. A líder tentou emplacar minisséries e até uma mininovela protagonizada por Tarcísio Meira, mas nada segurou o “trem bala” da Manchete, que chegou a ter 42 pontos contra 22 da concorrente. Da terceira semana até o último capítulo, Pantanal teve médias impensáveis fora da Globo.
Pantanal revelou Cristiana Oliveira, Marcos Winter, Marcos Palmeira, Rômulo Arantes e Carolina Ferraz. E resgatou atores já consagrados como Claudio Marzo, Natália Thimberg, Jussara Freire, Cássia Kiss, Rosamaria Murtinho, Tarcísio Filho, Ângela Leal, Sérgio Brito e e Ítala Nandi.
O contato direto com a natureza proporcionou cenas de rara beleza, embaladas por uma trilha sonora feita sob medida por Marcus Viana. As músicas acabaram sendo fundamentais para a identidade da obra, uma das marcas da novela. A região do Pantanal virou tema de reportagens e documentários, alavancando o turismo como nunca.
Outras exibições
Na Manchete, a novela rendeu duas reprises:
- entre 1991 e 1992, às 19h30, substituindo a reprise de Kananga do Japão
- entre 1998 e 1999, às 21h30 (substituiu Brida, que foi cancelada devido à crise que resultaria na venda da emissora).
Em 2008, o SBT re-exibiu Pantanal como estratégia para combater o crescimento da Record. Novamente a trama clássica teve boa audiência, a ponto da emissora esticar a novela. Os editores faziam essa mágica incluindo os tradicionais clipes musicais (que sobrevoavam o Pantanal) ao longo dos capítulos.
Em 2022, finalmente a TV Globo estreou o remake da novela. A pandemia do corona vírus adiou o cronograma de novelas da emissora. Foi a segunda novela da história a ser refeita no horário mais nobre da emissora. A primeira havia sido Selva de Pedra, em 1986.