Grevistas invadem torre e veiculam 10h de protestos

Com salários atrasados, funcionários em greve e sindicalistas invadiram os transmissores de São Paulo, veicularam pedidos de socorro e entrevistas com políticos de esquerda. Para a Manchete, a CUT orquestrou a ação para assumir a emissora.

Na madrugada do dia 16 de julho de 1993, cerca de 50 funcionários da TV Manchete de São Paulo – que estavam em greve desde 19 de março – invadiram o prédio que abriga a antena da emissora, localizado na Rua Bruxelas, Zona Oeste da capital paulista.

Os grevistas suspenderam a transmissão da programação, e passaram a veicular slides (imagens congeladas) de textos impressos em papel. As mensagens denunciavam o não pagamento dos salários por parte da direção da emissora, e a situação precária que atravessavam.

O prédio ocupado abrigava o conjunto de transmissores e a torre que sustenta a antena da emissora, de onde eram irradiada a programação para as antenas dos telespectadores de toda região metropolitana de São Paulo e também parte do interior do estado (até a região de Limeira), num raio de até 200km.

Negociações

O delegado da 23ª DP, Luiz Carlos do Carmo, conversou com os grevistas às 11h da manhã e combinou que só os expulsaria caso houvesse depredação e tumulto. Segundo o delegado, este foi um pedido da própria direção da emissora. Do Rio de Janeiro, Adolpho Bloch telefonou por volta das 12h30 para o local e conversou com um dos diretores do Sindicato dos Radialistas de São Paulo, Francisco Pacheco Neto.

O empresário propôs pagar 30% dos salários de maio na segunda-feira, 70% na quinta, e quitar os débitos de junho uma semana adiante. Os funcionários não aceitaram, alegando que nem o Grupo Bloch e nem a IBF tinham condições de administrar a emissora. Os grevistas também queriam a cassação da concessão do canal, intervenção dos ministérios do Trabalho e das Comunicações nas negociações, e auditoria do Tribunal de Contas da União.

A invasão da Manchete deu o que falar

Programação Pirata

Às 13h os funcionários levaram ao ar o primeiro “programa” de debates, que teve como “âncoras” os presidentes dos Sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas. Meia hora depois o senador Mário Covas se pronunciou no canal, solidarizando-se com os grevistas e prometendo intermediar junto ao presidente Itamar Franco, e aos ministros das Comunicações e do Trabalho.

Depois, chamado por Oscar Bloch (que se recusou a atender a imprensa), conversou pelo telefone com Adolpho Bloch. Após comunicar aos grevistas a proposta de Bloch, o senador reforçou sua promessa de pedir intervenção do presidente e dos ministros das Comunicações e do Trabalho.

No meio da tarde entraram no ar a vereadora Ana Martins (PCdoB) e o deputado federal José Dirceu (PT-SP), falando em apoio aos manifestantes. No fim da tarde, os funcionários se reuniram para decidir o editorial que levariam ao ar. “Vamos ficar aqui dentro até nos pagarem”, disse Pacheco. Mas liberaram o prédio antes das 18h. Os “programas” chegaram a atingir dois pontos no Ibope. No dia seguinte, a situação foi amenizada com o pagamento de metade do débito que estava atrasado.

A greve virou Manchete

O episódio foi notícia nos telejornais de todas as emissoras naquela noite, e também nos principais jornais impressos do dia seguinte. Na Manchete, a abordagem foi de encontro ao posicionamento formal da emissora sobre o ocorrido onde, num editorial lido por Carlos Chagas, a Bloch insinuava que o movimento foi orquestrado pela CUT, que com o tumulto, buscava influenciar o governo a entregar a gestão da rede para uma fundação a ser criada e gerenciada pelos funcionários.

Por Diogo Montano

Diogo Montano é Bacharéu em Ciência da Computação, pós graduado em Gestão de Negócios, e trabalha há quase vinte anos unindo duas coisas que sempre gostou: comunicação e tecnologia. Cresceu assistindo à Globo e Manchete, canais de tv que tinham as melhores imagens da região. Em 1999, ainda antes de entrar na faculdade, publicou a primeira versão deste site, logo após a venda da Manchete.