Carta de Adolpho Bloch sobre retomada da TV Manchete

Em abril de 1993, logo após conseguir liminar que lhe garantia de volta a gestão da Rede Manchete (cinco emissoras de TV, cinco rádios FM e uma AM), o então presidente do Grupo Bloch escreveu carta pública sobre o evento. Além da Revista Manchete, também publicou nos principais jornais do país. O empresário justifica os motivos que o levaram a pedir, e a conseguir, tal feito.

Carta de Adolpho Bloch sobre retomada da Manchete - 1993
Carta de Adolpho Bloch sobre retomada da Manchete – 1993

ADOLPHO BLOCH escreve:

REDE MANCHETE É BLOCH

Semana passada, tomei conhecimento de um “Comunicado da Rede Manchete do Grupo Lucas de Oliveira”. Era uma exposição de motivos ao que tratava-se de um plano fantasioso. Para viabilizar o funcionamento da Rede, Hamilton Lucas de Oliveira pretendia vender o patrimônio que não lhe pertencia.

Gostaria de historiar os fatos. Em junho de 1992, celebramos um “Protocolo de Intenções”, cedendo 49% das cotas da Rede Manchete de Rádio e Televisão ao Sr. Hamilton Lucas de Oliveira, prometendo ceder os restantes 51% mediante condições específicas a serem cumpridas. Ele se comprometeu a pagar nossos compromissos no valor aproximado de 110 milhões de dólares.

Dez meses se passaram. A muito custo, e com muito sofrimento, recebemos apenas 8 milhões e 700 mil dólares. E nenhum outro compromisso foi quitado. Do Natal para cá, ele não pagou mais nada, deixando também os funcionários da Rede sem salários. Nos cartórios do Rio e de São Paulo cerca de 300 títulos protestados.

Na exposição de motivos ao Ministério das Comunicações, Hamilton Lucas de Oliveira reafirma: “Dentro do mesmo espírito, o Grupo Lucas de Oliveira está disposto, também, a promover, desde já, gestões visando à alienação de patrimônio com o objetivo de capitalizar a Rede Manchete. Desse procedimento fazem parte estudos para a venda de patrimônio pessoal, do próprio complexo IBF, do conjunto de emissoras de rádio e sem excluir a possibilidade de venda das emissoras de TV, com exceção dos canais do Rio de Janeiro e de São Paulo.”

Há vinte dias não mais falava com ele e assim recuperei a minha saúde. Precisava telefonar vinte vezes por dia para ser atendido uma única vez. Ele sempre transferia para a sexta. É o dia em que viaja para Miami, onde tem um palácio.

Ficou evidente o seu propósito de vender todo o patrimônio de uma Rede, pela qual ainda não havia pago para ir viver no exterior como príncipe, destronado mas rico. Esse era o seu plano. E, através do comunicado que enviou ao Ministério das Comunicações, desejava que o governo aprovasse a sua inusitada proposta.

Hamilton Lucas de Oliveira tem fala mansa. Não perde a calma nem desanima. Revelou-se incapaz de administrar a Rede. Como empresário, não foi além da “raspadinha”.

Em 70 anos de trabalho no Brasil, jamais ganhei dinheiro pelo dinheiro. Noventa por cento de minhas dívidas foram resultantes de juros acumulados, cuja taxa de inflação mensal chegou a 70%. Esses juros monstruosos eram debitados em nossa conta.

Meus amigos:
Comecei a vida com uma pequena máquina impressora que hoje está no hall de nossa sede, no Rio de Janeiro. Costumo dizer que conheci no Brasil a miséria rica. Hoje, conheço a riqueza miserável. Sou otimista de nascença. Reassumi a Rede por via judicial. E com meus sobrinhos Oscar e Jaquito, meus amigos e funcionários, posso garantir que a Rede Manchete, com uma programação de alta classe, com profissionais competentes e artistas de primeira grandeza, voltará a ser o que foi: um orgulho dos brasileiros.

Adolpho Bloch, abril de 1993
Adolpho Bloch, presidente das empresas Bloch

Por Diogo Montano

Diogo Montano é Bacharéu em Ciência da Computação, pós graduado em Gestão de Negócios, e trabalha há quase vinte anos unindo duas coisas que sempre gostou: comunicação e tecnologia. Cresceu assistindo à Globo e Manchete, canais de tv que tinham as melhores imagens da região. Em 1999, ainda antes de entrar na faculdade, publicou a primeira versão deste site, logo após a venda da Manchete.